Na edição da revista Veja de 14 de maio, meia página foi dedicada à matéria sobre a milícia carioca "Liga da Justiça", supostamente chefiada por um deputado estadual. A outra metade da página foi ocupada por uma propaganda. Os anunciantes são sim importantes para a manutenção de qualquer meio de comunicação. A problemática se inicia quando o anúncio torna-se mais importante que o compromisso com a informação do público. Veja a matéria:
“Milícia do Rio ameaça até a PM
“Milícia do Rio ameaça até a PM
Máfia chefiada por políticos planejou morte de coronel
A Liga da Justiça é uma das milícias que aterrorizam o Rio de Janeiro. Ela extorque comerciantes, moradores e motoristas de vans que trafegam ilegalmente na Zona Oeste do Rio. Em troca do dinheiro, promete segurança. O deputado estadual Natalino José Guimarães, do DEM, e seu irmão, o vereador Jerônimo Guimarães, do PMDB, são acusados de liderar a quadrilha. Jerônimo está preso desde dezembro último, por formação de quadrilha. Natalino só não lhe faz companhia porque tem imunidade parlamentar. Na semana passada, tornou-se público o inquérito da polícia que envolve os Guimarães em uma tentativa de assassinato. Em 2005, os bandidos da Liga da Justiça atiraram em Marcelo Lopes, um informante da polícia que denunciou os achaques feitos pela máfia aos donos de vans. De acordo com o inquérito, os irmãos teriam assistido ao crime. Luciano Guimarães, filho do vereador, é apontado como autor de alguns dos disparos. A polícia também recebeu denúncias de que os irmãos Guimarães planejavam matar o coronel da Polícia Militar Dario Cony, que atrapalhava os negócios da milícia. Organizações como a Liga da Justiça constituem um poder paralelo no Rio. Pelo menos noventa das 500 favelas da cidade são controladas por milícias. A maioria delas é chefiada por policiais reformados.
Os irmãos Guimarães, por exemplo, eram policiais civis. Enriqueceram, entraram na política e, agora, tentam legalizar seu negócio. Em abril, Natalino Guimarães conseguiu que a Assembléia Legislativa do Rio aprovasse uma proposta de criação de polícias comunitárias constituídas por policiais aposentados. O governador Sérgio Cabral garante que vetará essa e qualquer outra iniciativa semelhante”.
O vereador Guimarães: preso desde dezembro por formação de quadrilha
Observação: Achaques = “impostos” cobrados ilegalmente
Vou poupar comentários ao péssimo título da notícia e ressaltar que, na edição em que a matéria em questão foi publicada, foram dedicadas duas páginas para uma "importantíssima" exposição de modelos de alta costura baseados nas histórias de super-heróis.
As milícias estão ocupando os espaços que o governo deixou pra trás. Elas atestam a impotência do poder público. Os grupos paramilitares expulsam traficantes de zonas onde a polícia não se arrisca a chegar. Um número crescente de grupos de milicianos armados tem dominado áreas cada vez maiores das favelas do Rio de Janeiro.
Estas milícias prometem acabar com o tráfico nas comunidades e extinguir as guerras do narcotráfico pelo controle do território. Por um lado, superam a inoperância da polícia; por outro, impõem taxas e mecanismos de controle que passam pela exploração de redes de transportes ilegais ou exploração clandestina de sistemas de Internet e televisão a cabo. As milícias arrecadam por mês cerca de dois milhões de euros, só em taxas de proteção.
Segundo Michel Misse, professor de Sociologia e coordenador do Núcleo de Estudos da Cidadania, Conflito e Violência Urbana da Universidade do Rio de Janeiro (UFRJ); "A atuação das chamadas milícias está mais próxima da máfia. A milícia impõe-se, a população não pode dizer não".
Em entrevista ao jornal O Globo, Rubem Cesar Fernandes, diretor da ONG Viva Rio, afirmou que as milícias são um sintoma da incapacidade do sistema de segurança pública de garantir a lei. Segundo ele: "As milícias paramilitares multiplicam-se por diversos países da América Latina, criando poderes paralelos, fora da ordem democrática. Parecem resolver um problema imediato, do domínio territorial pelos criminosos. Mas criam um novo problema, a tirania de grupos locais. É assim no Haiti, na Colômbia e em alguns países da América Central. É uma tendência crescente, fruto da fragilidade do Estado de direito nestas sociedades".
Vale ressaltar que o poder paralelo nos bairros de baixa renda não está presente apenas na cidade do Rio de Janeiro. Em Salvador, alguns dos bairros mais violentos, como Santa Cruz, Castelo Branco, Pau da Lima, Arenoso e Engomadeira perderam módulos policiais nos últimos meses. Doze dos 150 módulos policiais foram fechados, alguns deles por bandidos. Isto tem despertado um sentimento de insegurança nos moradores de comunidades periféricas. O que deveria servir como ponto de referência à segurança da população nos bairros, passa por um crescente processo de desativação.
Confira uma matéria da "RedeTV!" sobre o surgimento das mílicias no Rio de Janeiro e o efeito das mesmas na Somália:
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